O céu ainda estava
rosa. Eu podia ver pela janela que havia encima da sua cama. Olhei para baixo e
seu gato brincava com os dedos do meu pé, tentando morder, apesar de não ter
dentes tão afiados. Tirei o lençol do meu corpo, e antes de levantar da cama, olhei
para você. Estava tão lindo. Os olhos fechados, a boca fechada, mas a camisa
quadriculada que estava metade aberta. Será que havia sido eu que havia aberto?
Saí da cama, os pés
encostando no chão frio. Era o primeiro dia do inverno. Eu estava só com a sua
camisa que ficava igual um vestido em mim. Prendi meu cabelo, vesti minha
calça, minha camiseta, meu casaco, minha bota, e antes de sair do seu quarto,
olhei de novo para você. Tão lindo. Tão meu. E ao mesmo tempo, não era meu.
Você nunca foi, e sabíamos disso. A noite anterior havia sido um erro.
Quando saí do seu
apartamento pequeno, peguei o primeiro táxi que vi pela frente. O taxista
perguntou:
- Qual seu destino,
menina?
E eu respondi:
- Para algum lugar
em que eu não me sinta sozinha. Para longe de todas as decepções desse amor que
eu sabia que não iria dar certo, mas ao mesmo tempo me forcei a acreditar que
ele era real. E me iludi. – Olhei bem fundo nos olhos do taxista. – Me leve
para o lugar onde não há ilusões e nem desilusões, moço.
E o taxista não
perguntou de novo e não gritou para eu sair do táxi. Ele apenas assentiu e
começou a dirigir. Entendia o que eu estava sentindo. Talvez já havia tido
outras milhares de passageiras, com o coração machucado, pedindo para ir para
algum lugar onde não se sentia sozinha. E com o tempo, ele aprendeu a não
perguntar o que havia acontecido a aquelas pessoas. Os corações partidos são
sempre os mais difíceis de se comunicar.
Enquanto o táxi
andava rápido, eu olhava pela janela o dia começando. Mulheres tirando a roupa
do varal. Crianças indo para a escola. Pessoas passeando com seus cachorros.
Pela tevê do bar, vi o jornal da manhã começando. Tudo estava seguindo sua
rotina monótona sem se preocupar que no táxi ao lado havia uma menina pedindo
por socorro. Para que tirassem da sua memória todos os beijos da noite passada.
Todos os abraços. O que havia começado apenas como uma visita para devolver o
livro, terminou com os dois abraçados na cama. Traçando o futuro. Contando os
filhos. Fazendo carinho no gato filhote. Tudo mera imaginação.
Eu queria que
tivesse dado certo, sabe? Queria realmente. Mas o meu jeito tímido, com medo de
expressar meus sentimentos, me impediu de sentir seu amor. Mas nós dois
erramos, querido. Adiamos nossos sentimentos, igual fizemos com o nosso amor. E
isso bagunçou tudo. Bagunçou minha cabeça. Bagunçou a sua cama. Bagunçou tudo o
que havíamos criado nesses últimos meses.
O táxi parou na
frente da sua casa de novo. Olhei assustada para o motorista e ele sorriu.
- Sou velho, menina,
mas já tive o coração machucado inúmeras vezes. Já tentei fugir dos meus
sentimentos entrando em um táxi, mas nunca deu certo. Os sentimentos vão atrás
de você e te pegam. – Ele deu um suspiro. – O único jeito de resolver tudo isso
é conversando com os sentimentos. Talvez eles entendam. Talvez não. No final,
tudo vai se resolver do melhor jeito. Mais enfrentar é o principal.
Olhei para o
taxista. Os olhos cansados, a roupa já amarrotada, a rádio tocando alguma
música aleatória. Ele também me entendia. Ele também já havia deitado sem
querer na cama de alguém, já havia errado e consertado seus erros, tudo isso em
uma vida só.
E por esse motivo,
saí do táxi e enfrentei meus sentimentos.
Lena, realmente temos que enfrentar nossos sentimentos, por quê senão ficamos andando em círculos na vida sem achar uma solução...
ResponderExcluirEMOCIONADA!!! Sempre aprendendo...
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